Entrevista Exclusiva: Infectologista Demetrius Montenegro, médico no Hospital Português e Hospital Universitário Oswaldo Cruz

Reportado pela primeira vez em dezembro de 2019 na China, o surto do  novo coronavírus batizado como Covid-19 já matou mais de 600 mil pessoas e causou alarme entre as autoridades sanitárias de todo o mundo e foi declarado Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional pela Organização Mundial de Saúde (OMS), em janeiro de 2020.  

Dois anos após sua descoberta o mundo ainda sofre suas consequências. Para falar sobre o assunto o Jornal do Sertão entrevistou o médico infectologista, Dr.  Demetrius Montenegro, que atua no Hospital Português e Hospital Universitário Oswaldo Cruz, no Recife- PE. 

Montenegro comentou sobre a importância da vacinação e que é seguro imunizar as crianças entre 05 e 11 anos, a última polêmica gerada sobre a pandemia. Outro assunto abordado foi a variante Ômicron que, apesar de causar quadros mais leves, não deve ser subestimada. 

O médico infectologista tratou também sobre a volta às aulas e a importância de continuar usando a máscara no dia a dia. Vejamos a entrevista completa: 

Jornal do Sertão – Já se passaram dois anos desde o início da pandemia, e a impressão que fica é que o brasileiro ainda não entendeu a gravidade da situação. A que se deve ainda a existência de tantos casos de Covid no País e tantas variantes surgindo? 

Demetrius Montenegro – Na verdade, não foi só o brasileiro que não aprendeu ainda, no mundo todo a gente vem acompanhando o aumento do número de casos de Covid e isso está relacionado ao não cumprimento de medidas de segurança, como a utilização de máscara, distanciamento social e a vacinação. Então, países da Europa, por exemplo, estagnaram no número de pessoas vacinadas principalmente por conta da do movimento contra a vacina que, diferente do Brasil, é uma questão política, já que o brasileiro tem a cultura da vacina. Outro problema é a falta de vacinas para países pobres alimentando a transmissão viral e a chance de surgimento de novas variantes

JS – Sobre a variante ômicron inicialmente disseram, que ela não era grave e seus sintomas eram leves, mas já existe uma defesa para não se baixar a guarda, pois a partir dela pode haver agravantes, essa afirmação é correta?

Demetrius Montenegro – Realmente a variante ômicron causa quadros mais leves, então é verdade. O problema é que ela tem uma transmissão muito maior que as outras variantes, sendo transmitida para muitas pessoas ao mesmo tempo, daí para frente é uma questão matemática, um percentual pequeno que tem chance para evoluir com quadro mais grave em um montante muito grande de pessoas contaminadas ao mesmo tempo pode sobrecarregar qualquer sistema de saúde. Portanto, é esse o grande problema e é por isso que as pessoas devem se precaver e tomar o cuidado para não se contaminar e também para não transmitir o vírus.

Sem festas 

JS – Passamos pelas festas de final de ano e houve um aumento nos casos de contaminação e agora é o  mês do tradicional carnaval, qual a orientação para aquelas pessoas que insistem em brincar na festa de momo, mesmo correndo o risco de se contaminar?

Demetrius Montenegro – Nesse momento ninguém deve ir para nenhuma festa, os encontros devem ser restritos, haja vista que famílias inteiras se contaminaram nas festas de final de ano.

JS – Com relação à vacina das crianças de 05 a 11 anos, qual avaliação o senhor faz? Alguns pais têm dúvidas se vão vacinar seus filhos por tantas notícias falsas espalhadas…. 

Demetrius Montenegro – A vacina é segura. Não se tem dúvidas. Não entendo porque se acredita mais em fakes quando o mundo sabe que essas informações falsas existem e são ativamente difundidas! A criança também morre de Covid. A criança também transmite o vírus. A vacina para elas é fundamental para sairmos dessa situação.

Volta às aulas

JS – E a volta às aulas presenciais, podem ser comprometidas por causa desse aumento de casos de Covid agora associada à gripe influenza?

Demetrius Montenegro – Pode, sim, mas se o processo de vacinação em crianças for efetivo, essa possibilidade é menor.

JS – O senhor acredita que a máscara será utilizada por muito tempo ainda?

Demetrius Montenegro – Sem dúvida, até porque já vimos que as reinfecções são constantes, logo as máscaras serão fundamentais nesse controle.

JS – Já que a vacina protege, mas não cura, como o senhor analisa a cobrança do certificado de vacinação?

Demetrius Montenegro – Extremamente importante, o vacinado, se tiver o vírus, tem uma carga viral menor, diminui a chance de transmissão.

Aprendizado

O médico infectologista fala da importância de continuar usando a máscara no dia a dia

JS – Qual aprendizado fica para as futuras gerações e como o jovem deve se comportar a partir dessa pandemia, que muda todo o cenário que eles conhecem? 

Demetrius Montenegro – A globalização do mundo não diz respeito apenas às pessoas conectadas, mas a interação que existe entre os seres vivos. Fazemos parte de um mundo plural, onde tudo precisa estar em harmonia, uma estrutura como um vírus está nos colocando à prova. Vamos deixar de arrogância e nos curvar à natureza, nossa vida depende desse equilíbrio.

JS – Falando ainda sobre a  ‘Flurona’ (infecção pelos vírus H3N2 e Covid-19 ao mesmo tempo) pegar gripe influenza e Covid-19 é um agravante nesse período? Até porque nem aprendemos ainda a lidar com a Covid….

Demetrius Montenegro – A Flurona acontece pela contaminação dos dois vírus, covid-19 e influenza, no entanto, isso não vai causar um agravamento da situação, lógico que a conduta que precisa ser tomada é objetivando mais os cuidados com a covid, que é uma doença que tem um potencial de gravidade muito maior que a influenza. 

JS – E para finalizar a vacina é o caminho, mas não funciona sozinha, as pessoas precisam entender que ainda é necessário seguir os protocolos da OMS…

Demetrius Montenegro – Nós só vamos sair desse labirinto, que estou chamando de ‘Caverna do Dragão’, (uma referência  a desenho animado dos anos 80 onde os personagens não conseguiam sair de uma caverna, mesmo as vezes visualizando o outro lado), voltando ao nosso tempo, enquanto não tivermos vacinação para todos, inclusive em países mais pobres que o Brasil, que tem uma baixa taxa de vacinação, vai ser muito difícil sair dessa situação.

 É importante frisar que não é a vacina apenas, precisamos nos proteger mantendo o distanciamento social e a utilização das máscaras, veja que o surto de influenza que aconteceu no final do ano passado e início deste ano é um reflexo das condutas humanas, justamente, porque as pessoas relaxaram com o uso das máscaras e consequentemente em seguida veio essa onda com a variante ômicron, que hoje é o vírus mais transmissível já detectado, levando o mundo a viver essa fase novamente de tantos casos de contaminação.