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Pernambuco, 17 de janeiro de 2025

Agronegócios

Pernambuco e o sebastianismo

Milagres não ocorrem com tanta frequência Em 1578 um jovem monarca português, não satisfeito com o fato de Portugal se fazer presente no Sul da África, América do Sul e Ásia, resolveu conquistar o Marrocos. Na lendária batalha de Alcácer-Quibir seu exército foi derrotado resultando ainda na morte do impulsivo comandante. Este fato mudou drasticamente […]

Postado em 07/12/2023 2023 13:01 , Agronegócios. Atualizado em 07/12/2023 13:14

Colunista

Milagres não ocorrem com tanta frequência

Em 1578 um jovem monarca português, não satisfeito com o fato de Portugal se fazer presente no Sul da África, América do Sul e Ásia, resolveu conquistar o Marrocos. Na lendária batalha de Alcácer-Quibir seu exército foi derrotado resultando ainda na morte do impulsivo comandante.

Este fato mudou drasticamente a história portuguesa que, poucos anos depois, passou a ser regida por D. Felipe II, da nobreza espanhola, o que além da insatisfação generalizada facilitou a crença de que D. Sebastião não havia morrido, estaria em alguma ilha desconhecida, esperando o correto momento do retorno.

Pernambuco em algum momento padeceu desse sentimento. Uma aristocracia que deixou de ser administradora da capitania hereditária levou o estado a profunda letargia, chegando ao autoflagelo no final do século passado. Recife viu cidades como Salvador e Fortaleza ultrapassando-o em importância econômica, notando que ano após ano deixava de ser o centro gravitacional da região Nordeste, para onde se dirigiam os jovens em busca de estudo, os empresários em busca de oportunidade e a intelectualidade em busca de cultura.

No início do século XXI houve uma injeção de ânimo na autoestima pernambucana com a duplicação da rodovia BR 232 em seu trecho Recife-São Caetano, seguindo-se da reindustrialização do estado a partir da escolha de Suape como base para a Refinaria Abreu e Lima e Goiana, no litoral Norte, como local de instalação da fábrica de automóveis FCA.  Considerando a atração de dezenas de empresas dos segmentos metalmecânico e eletrônico, em apoio aos dois grandes empreendimentos.

O Porto Digital constitui-se também em uma grande conquista com esforços públicos privados, contando atualmente com aproximadamente quatrocentas empresas e dezessete mil postos de trabalho diretos e indiretos.

Vale notar a importância para o estado da consolidação do polo de fruticultura de Petrolina/Juazeiro como uma das áreas mais destacadas do ponto de vista de tecnologia agrícola do país e uma das mais relevantes em todo o mundo tropical.

Cada qual que cuide de seu destino

Os outros estados da região adotaram um processo de transformação acelerado. O estado da Bahia havia conquistado o complexo petrolífero de Camaçari, a fábrica da Ford, o desenvolvimento do Cerrado e abriu os olhos para a importância do polo frutícola do São Francisco. O Ceará, conseguiu recursos para construir o Porto de Pecém, investiu na educação básica e desenvolveu de forma marcante a agricultura irrigada chegando a ser o principal produtor de rosas no país. O Rio Grande do Norte e a Paraíba, de modo discreto consolidaram a malha viária e viram polos importantes como Mossoró e Campina Grande crescerem em termos econômicos e tornarem-se exemplos de educação superior e desenvolvimento tecnológico. Os estados de Alagoas e Sergipe não ficaram para trás. Sergipe, de modo engenhoso passou a ser considerado como um dos mais importantes produtores de milho na região de Alagoas, apesar da lentidão viu Maceió e seu litoral ser considerado um dos mais relevantes destinos turísticos da região.

Além do que foi mencionado, Pernambuco nas últimas duas décadas testemunha uma dinâmica diferenciada em dois vetores. A consolidação da rede de instituições de ensino médio e superior e a dinâmica do setor de serviços em todos os municípios, destacando-se as pérolas maiores deste colar que constitui as cidades de médio e grande porte nos trechos Recife-Araripina-Petrolina. Esses dois movimentos ainda passam despercebidos por muitos. O primeiro dotou o estado de inteligência e recursos humanos qualificados em qualquer área do conhecimento, enquanto o segundo fez prosperar o comércio, a indústria, a área de saúde, o setor de ensino e, consequentemente, os empregos e a prosperidade.

Comparar Arcoverde, Serra Talhada e Araripina de hoje e o que foi há vinte anos é algo relevante sob todos os aspectos. É lá onde Pernambuco muda de modo visível e onde está a grande chance de integração econômica estadual e parte da solução para suas questões estruturais da região metropolitana.

Construindo um novo estado com as próprias mãos

Sendo assim e considerando que não se contará com um governo federal que exerça a função de dínamo da economia estadual, até porque a situação do país hoje é muito mais vulnerável do que na primeira década do século, resta o estado descobrir o que existe de potencial, otimizando a juventude egressa dos cursos superiores, seus recursos hídricos do interior seja para a aquicultura ou para a irrigação, universalizar o ensino em tempo integral e de qualidade e apoiar a iniciativa privada, no que possível e necessário na geração de empregos de qualidade.

Com isto, A deixa de culpar a B pela pelas dificuldades e limitações, até porque é sabido que essas letrinhas se equivalem. E aí caberá a sociedade civil redefinir sua associação com os entes governamentais e tomar o futuro do estado em suas mãos. Em se tratando de Nordeste há um exemplo que deve ser acompanhado, o estado do Ceará. Foi o jovem empresariado cearense que através de discussões incessantes mudou a face do estado construindo as condições políticas para a eleição de Tasso Jereissati em 1986 e pavimentando um modelo de governança que perdura desde então.

A vitória dos mascates

Voltando a questão da integração, a exuberância dos polos econômicos regionais transfere o protagonismo do desenvolvimento estadual de um estamento centrado no segmento sucroalcooleiro que por muito tempo dominou a economia local para uma nova geração de empresários que se fizeram basicamente sozinhos e hoje são aqueles que maior influência exercem no cenário econômico. Não são grupos hegemônicos e nem são considerados patriarcas ou titãs mas uma miríade de empreendedores que somados representam o presente e o futuro do estado. Na realidade este movimento silencioso e difuso demonstra a vitória dos mascates, resgatando a vocação de Pernambuco, remetendo-o a um cenário futuro.

        

 

1Professor Titular da UFRPE-UAST

Serra Talhada, 06 de dezembro de 2023