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Pernambuco, 28 de abril de 2024

Saúde

Janeiro branco e os desafios psicanalíticos da saúde mental

É intrigante observar que Janeiro, paradoxalmente, testemunha uma evasão significativa nas clínicas de saúde mental, indicando um momento de desistência que só se reverte após Março

Postado em 09/01/2024 2024 10:49 , Saúde. Atualizado em 09/01/2024 10:52

Colunista

Daniel Lima, psicanalista.
www.psicanalisedaniellima.blogspot.com
daniellimagoncalves.pe@gmail.com
@daniellima.pe

 

Refletir sobre Janeiro Branco torna-se um exercício intricado à luz da teoria psicanalítica, considerando as complexidades enfrentadas por aqueles que lidam com carências fundamentais para uma vida digna. A ausência de elementos vitais, como alimentação adequada, água potável, saneamento, medicamentos e acesso à saúde de qualidade, projeta uma sombra sobre a possibilidade de alcançar uma saúde mental plena.

É intrigante observar que Janeiro, paradoxalmente, testemunha uma evasão significativa nas clínicas de saúde mental, indicando um momento de desistência que só se reverte após Março. Surge a indagação: como podemos abordar a saúde mental quando as bases para uma existência saudável estão comprometidas? Quais são os contornos específicos dessa saúde mental à luz da psicanálise, e o que profissionais e sociedade podem fazer para garantir acesso universal à saúde de qualidade?

Janeiro Branco, como movimento, desempenha um papel crucial ao fomentar debates, reflexões e chamar a atenção de diversos setores para as necessidades relacionadas à saúde mental. No entanto, a realidade social impede que muitos tenham acesso a tratamentos e acompanhamento especializados, enquanto o olhar preconceituoso em relação à busca de ajuda intensifica os desafios enfrentados pelos indivíduos que sofrem.

A estigmatização em torno dos transtornos mentais, evidenciada por expressões como “frescura”, “preguiça” e “falta de força de vontade”, contribui para o agravamento do sofrimento psíquico. Dados alarmantes da OMS ressaltam que a depressão é hoje a doença mais incapacitante globalmente, afetando cerca de 15% da população brasileira. Nesse contexto, análise, psicoterapia e consulta psiquiátrica emergem como cuidados essenciais, sobretudo quando o sofrimento impacta o bem-estar e a qualidade de vida.

O advento da internet trouxe consigo uma nova dinâmica na busca por respostas sobre saúde mental. A prática de autodiagnóstico baseada em pesquisas no Google muitas vezes leva a conclusões apressadas e inadequadas, influenciadas por informações superficiais. Este fenômeno se manifesta na proclamação precipitada de transtornos, como ansiedade generalizada ou TDAH, após uma rápida consulta virtual.

Vivemos numa era de rótulos, onde a identidade do indivíduo é frequentemente substituída por diagnósticos informais. Contudo, é vital compreender que apenas um profissional especializado pode oferecer um psicodiagnóstico preciso, respeitando a complexidade do psiquismo e a singularidade de cada história de vida. O olhar humanizado de Winnicott, ao defender a manifestação de todas as emoções humanas como parte da normalidade, destaca a importância de aceitar a tristeza como uma emoção legítima.

Diagnosticar-se por meio de pesquisas na internet, ao invés de explorar profundamente o subjetivismo do psiquismo, é preocupante. A singularidade de cada indivíduo, incorporada em sua história de vida, demanda uma abordagem mais cuidadosa. Uma análise não busca formar cópias do analista, mas sim proporcionar uma vida mais interessante e ampliar o repertório psicológico para uma existência saudável.

Substituir estigmas por estima é a chave para uma vida equilibrada, especialmente quando se trata da complexidade da saúde mental. Janeiro Branco, além de promover conscientização, deve impulsionar ações efetivas, não apenas no âmbito profissional, mas na construção de uma sociedade que compreenda, respeite e promova a saúde mental de todos os indivíduos, conforme delineado pelos princípios da teoria psicanalítica. Em última análise, ao investirmos no entendimento e na valorização da saúde mental, não apenas como indivíduos, mas como coletivo, tecemos um caminho rumo a uma existência mais plena e significativa, onde a empatia e o cuidado consigo mesmo e com os outros se tornam pilares fundamentais para a construção de uma sociedade mais saudável e equilibrada.