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Pernambuco, 13 de setembro de 2024

Agronegócios

A pesquisa agropecuária nos estados do Nordeste

Os institutos estaduais e suas contribuições

Postado em 29/02/2024 2024 19:48 , Agronegócios. Atualizado em 29/02/2024 20:23

Colunista

 

Quando da fundação da Embrapa, em 1973, alguns estados do nordeste tinham seus institutos de pesquisa agropecuária. No caso de Pernambuco, o IPA existe desde 1935, quando, ainda não imagino a razão, o então governador Carlos de Lima Cavalcanti, um cidadão ligado ao setor canavieiro resolveu criar uma instituição de pesquisa neste estado, tendo escolhido como seu primeiro Presidente o Dr. Álvaro Barcelos Fagundes que, em 1932 havia concluído seu mestrado na Universidade de Rutgers, Estados Unidos.

Outras instituições se destacavam no estado do Ceará, no Maranhão, no Rio Grande do Norte, na Paraíba, em Alagoas, em Sergipe e na Bahia. Quase todas foram varridas do mapa, sobrando de forma efetiva e com grande esforço o IPA, a EMEPA e a EMPARN.

Algumas contribuições dessas organizações estaduais são ainda hoje reconhecidas apesar de duas ou três décadas de abandono e descaso. Quem em Pernambuco não sabe a contribuição que o IPA deu com as culturas da palma forrageira, sendo a primeira instituição brasileira a ter um programa[LG1] [JE2]  de pesquisa com estas espécies; assim como com o sorgo e o milheto, chamando atenção aqui para a contribuição determinante no uso das cultivares aqui desenvolvidas na consolidação do sistema de plantio direto no Cerrado; do tomate para indústria, tal como a cebola, cujas cultivares  ainda são usadas nas principais áreas irrigadas da região; dos feijões de arranca e de corda; do gado holandês, do 5/8 holando/zebu e do Guzerá; da introdução do camarão de água doce, na década de 70; da base de piscicultura de Serra Talhada que produzia alevinos para peixamento de um grande número de açudes e barragens do semiárido; entre tantos outros exemplos.

No caso da EPACE ainda hoje é reconhecida sua contribuição no melhoramento do feijão de corda. Já a EMEPA conseguiu construir o programa mais efetivo de pesquisa com caprino no Nordeste sendo responsável pela introdução de raças sul-africanas, além do não menos reconhecido trabalho com os gados Guzerá e Sindhi.

A situação é tão interessante que a principal cultivar de sorgo forrageiro usada no Nordeste, a IPA SF-15, é proveniente de um esforço conjunto do IPA com o corpo técnico da Secretaria de Agricultura de Alagoas, uma vez que a EPEAL já se encontrava extinta.

A gestão com visão embaçada

Com o avanço de visões neoliberais que pregavam e pregam a redução do estado a qualquer custo, a maioria dos governadores do país e, em especial do Nordeste, resolveram liquidar ou reduzir ao máximo a atividade de pesquisa dos institutos estaduais com a alegação de que a Embrapa, uma empresa de prestígio nacional e extremamente capaz poderia substituir essas instituições, que no ponto de vista limitado só constituíam em despesa e prejuízo.

Obviamente não necessita ser alguém especializado em agricultura para ver que este era um raciocínio falho. Os centros de pesquisa da Embrapa, principalmente os de produtos estariam voltados predominantemente para cadeias produtivas específicas, enquanto os ecorregionais tratam de regiões bem definidas. Um estado da federação é uma confederação de municípios de ambientes naturais e políticos e sistemas de produção os mais diversos. Neste ambiente a Embrapa não terá como operar. Caso se pretenda algum resultado,  tem que ter a cor e a conotação local, daí a importância de se contar, independente dos avanços obtidos pelas empresas privadas do setor, de uma base técnica que dê cobertura ao território das unidades federativas. Isto em termos de pesquisa, sem  falar  em extensão que é uma outra lógica, inclusive destacando o diálogo pesquisa-extensão, ou a falta deste, dentro dos estados

Tudo tem seu tempo. Inclusive de renovação

A verdade é que as instituições estaduais se encontram falidas ou semifalidas e não se vê ânimo nos gestores, que não  é  de agora mas há algum tempo, de enfrentar a questão. Para tanto, precisaria  admitir que  o deu certo há quarenta anos não funciona atualmente; que há uma revolução tecnológica em curso e que  demanda capacitação, infraestrutura de comunicação no que pode ser traduzido em internet e no uso nos processos de obtenção de conhecimento, agilidade de processos, aprendizado e cooperação. Ter a capacidade de eleger prioridades e seguir o plano traçado não é uma tarefa fácil e nem sempre possível. Uma coisa é certa: há espaço para as instituições estaduais de pesquisa, entretanto uma mudança radical de postura e de suporte deve ser posta em andamento. O formato atual não levará a lugar algum.

Ainda há tempo para se contar com um SNPA real      

Há um ponto importante a ser esclarecido. Recentemente o governo federal lançou o Novo Pac (Programa de aceleração do crescimento) e neste conjunto de iniciativa se recompõe o PAC Embrapa, tão útil à instituição e às organizações estaduais de pesquisa em 2009. Naquele instante havia uma discussão quase que surreal quando a Embrapa foi instada a apresentar uma proposta ao governo, havendo sido solicitado que não deixasse as instituições estaduais de fora da iniciativa. Durante um bom tempo, ao se montar o orçamento, havia uma parte da diretoria que acenava para um valor de cem milhões de reais a ser disponibilizado para as dezessete instituições estaduais. Entretanto, ao se refazer o plano este valor era reduzido para a metade até que em um determinado momento em uma reunião com um ministro que havia sido secretário estadual de agricultura e em cujo estado encontrava-se um dos mais renomados e ativos institutos, a ele foi lembrado da importância de se contar com esta rede funcionando com a qualidade exigida. Sem muito carinho pela causa mas entendendo o que lhe havia sido dito recomendou enfaticamente que no Pac Embrapa se mantivesse o valor de cem milhões, o que no afã da discussão foi entendido como cem milhões por ano, resultando em um valor até então inimaginável de duzentos e cinquenta milhões de reais destinadas à pesquisa estadual.

Foi um valor extremamente bem-vindo. Uma pena que os governos estaduais não cumpriram com sua parte e os recursos foram aplicados sem um plano que resultasse na reconstrução do SNPA – Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária, teoricamente uma iniciativa valiosa mas de uma eficácia muito abaixo do que se possa ter. Não imagine que esta é uma sessão de saudosismo gratuito mas que fique certo, sem que haja uma coordenação entre a academia, as entidades representativas do governo federal representado pela Embrapa, as instituições estaduais e as empresas deste negócio de SNPA não passam de uma miragem.

 

1Professor Titular da UFRPE-UAST