Ciência e inovação para um país chamado Brasil
A 5ª. Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação – CNCTI
Postado em 01/08/2024 2024 11:43 , Agronegócios. Atualizado em 01/08/2024 11:46
A 4ª. CNCTI foi realizada em 2010. Acompanhei de perto o evento e participei como um dos organizadores para as áreas de ciências agrárias. Depois de catorze anos, está sendo realizada durante esta semana a 5ª. CNCTI, em Brasília. Uma cerimônia de abertura onde se via o entusiasmo das mulheres e homens envolvidos com o desenvolvimento científico do país como há muito não se via.
A recomposição dos orçamentos para as agências de fomento, para as universidades, para os ministérios, basicamente todos, que interagem com o conhecimento tem sido uma prioridade seguindo a simples lógica de que ciência e tecnologia não é gasto, é investimento.
Há de se reconhecer que desde a fundação da Universidade de São Paulo em 25 de janeiro de 1934 até o presente, o país mudou. A partir dos anos setenta do século passado quando se implementou uma política de expansão dos cursos de pós-graduação, as demais regiões do país, além do Sudeste, passaram a fazer parte do mapa de formação de alto nível no Brasil e, atualmente, no Semiárido, são dezenas de programas que estão em curso, capacitando jovens alunos e professores para que possam servir melhor a região e suas comunidades.
Nações que têm feito a diferença
Apesar do negacionismo de alguns, a constatação de que as nações que colocaram como prioridade políticas de educação e desenvolvimento tecnológico conseguiram soltar as amarras do colonialismo econômico e cultural, superaram as dificuldades e se tornaram nações reconhecidas, prósperas e com um lugar assegurado no futuro. Alguns casos são emblemáticos, um deles é a Índia. Este país conseguiu se livrar do jugo colonial em 1947, sofreu para se reposicionar no cenário mundial mas, hoje é a quinta maior economia do planeta e pasmem, a maioria dos principais executivos das grandes empresas americanas e europeias são indianos ou de origem indiana. O segundo exemplo que também vem da Ásia é o Japão. Este foi o primeiro país asiático a se fazer notar, assustando as grandes potências que há cinquenta anos consideravam-no como uma ameaça aos seus interesses. O Japão se tornou reconhecido mundialmente por suas empresas automotivas e de eletrodomésticos e somente não foi além devido ao controle imposto sobre ele para proteger interesses de outras nações.
O terceiro é a China. Mesmo em tempos difíceis não descuidou da formação e nas últimas décadas investiu maciçamente em ciência e tecnologia e inovação se tornando o segundo mais importante exportador de bens e consumo e neste momento o principal país exportador de automóveis.
O caso da indústria automotiva chinesa é interessante. Com investimentos diferenciados em veículos elétricos eclipsou a indústria europeia, americana e japonesa que literalmente ficou para trás e tenta sobreviver às custas de taxação aos carros chineses. Os Estados Unidos, por exemplo, elevaram o imposto alfandegário para os veículos elétricos da China de 18% para 100%. Algo difícil de se entender do ponto de vista econômico e que a partir de exemplos nossos, como foi o caso da excessiva proteção à indústria de computação, atrasou o desenvolvimento por um bom período. Os consumidores pagam um preço elevado pela ineficiência da indústria local e as empresas não se tornaram competitivas, apesar de todas promessas e subsídios.
O Brasil retoma o caminho
O Brasil, nas últimas cinco décadas, se tornou um dos mais importantes atores na produção e comércio de alimentos. É um dos principais supridores de commodities e matérias primas agrícolas e minerais e, parte desta saga se deve à ciência e tecnologia. No caso da Agricultura, sobre a qual tive a oportunidade de participar de uma sessão que tratou dos avanços da ciência e chamar a atenção para a dependência tecnológica que a agropecuária nacional encontra-se exposta, haja visto o caso dos fertilizantes, dos agroquímicos, da inteligência por trás das máquinas e equipamentos da agricultura de precisão, da genética animal e vegetal, quando quase a totalidade das empresas nacionais de sementes foram adquiridas por empresas estrangeiras, mesmo considerando os avanços significativos testemunhados em várias áreas.
Um ponto consistente em toda a discussão que contou com a Presidente da Embrapa, a pesquisadora Silvia Massruhá, o professor Evaldo Vilela, presidente da Academia Brasileira de Ciências Agronômicas e o analista do Senado, Luiz Rodrigues, foi a importância dos bionsumos para o Brasil. Não apenas por ser o sistema que prevalecerá, mas por razões econômicas, sociais e de sustentabilidade. Não poderia deixar de mencionar aos participantes o feito da Dra. de Lourdes Aquino, uma dentista que desde a universidade trabalhou como estagiária do micologista Chaves Batista, na UFRPE, que em sua simplicidade e em um laboratório mais do que tradicional, no IPA, foi pioneira no desenvolvimento do protocolo de cultivo de cepas do fungo Metarhizium, em um meio de cultura baseado em arroz, eficiente no controle das cigarrinhas da cana-de-açúcar e em uso em todo o mundo tropical. Lembrando, contudo, que isto se deu há mais de cinco décadas. O caso mais emblemático de aplicação de bioinsumos é a Fixação Biológica de Nitrogênio, uma das tecnologias que assegurou o avanço e a competitividade da cultura da soja no país. Neste caso que se reconheça o pioneirismo, a dedicação e o legado da Dra. Johanna Dobereiner a partir de sua atuação na Embrapa Agrobiologia, em Seropédica, no Rio de Janeiro.
O semiárido sendo considerado como prioridade
Em tempos em se discute a próxima COP 30, o principal evento mundial sobre o clima, que ocorrerá em Belém do Pará em 2025 e onde todos os holofotes estarão focados na Amazônia, de chamar atenção para a região Semiárida. Não apenas pelos alertas recentemente enfatizados sobre o risco de aridização e até desertificação na região. Entretanto, é necessário deixar claro que o semiárido não é apenas uma área que merece preocupação por causa do desmatamento, o que é mais do que verídico e do uso irracional de suas plantas como lenha e carvão. A região conta com setenta por cento de sua área coberta pela Caatinga, uma floresta que sobrevive à ciclos de secas há milhões de anos e nela, entre sua flora, fauna e microrganismos estão, volto a insistir, a chave do reino para os avanços futuros no melhoramento genético de plantas que resistam às condições de menor disponibilidade de água e temperaturas mais elevadas. Neste caso, há uma demanda mais do que imediata por uma política específica de valorização dos recursos genéticos do semiárido brasileiro e, parafraseando um assessor de um presidente dos Estados Unidos que em uma discussão de campanha onde todos procuravam eixos para o que iriam propor aos eleitores, ele em alto e bom som soltou esta pérola: “a questão é a economia, estúpidos”. Jamais chegarei a ser tão enfático mas, que fique claro o fundamento para o desenvolvimento científico e econômico do semiárido e a mitigação aos efeitos das mudanças climáticas estão nos genes, genes, genes.
1Professor Titular da UFRPE-UAST