O pequeno e médio comércio encontram-se em risco
Mudanças são boas mas é importante dar a devida atenção
Postado em 24/10/2024 2024 13:54 , Agronegócios. Atualizado em 24/10/2024 13:54
Após a fase aguda da pandemia e outras questões de natureza política, o Brasil mostra sinais de ânimo em sua economia. Controle da inflação, compromissos creditícios pontualmente honrados, dólar estabilizado, produção agrícola crescente e crescimento do PIB superior ao esperado. Entretanto, há sinais de preocupação que nem sempre são devidamente avaliados. Um desses fatos se refere ao desempenho e à sobrevivência dos pequenos e médios negócios que lidam com calçados, moda, utilidades domésticas, perfumaria, equipamentos eletrônicos, entre outros. O período de isolamento da pandemia salvou milhões de vidas mas, comprometeu várias atividades. Apesar dos programas de apoio criados pelo governo federal e governos estaduais, nada substitui o cliente. Ao se ver passar dias e dias sem que aparecesse viva em sua empresa, a descapitalização e erosão do patrimônio desse empresário foi inevitável. Não foram poucos aqueles que mantiveram seus colaboradores à custa do sacrifício de suas poupanças, bens e empréstimos.
Novos sistemas de comércio e a invasão do e-commerce
O fato é que, surgiu com força uma atividade comercial que até então se apresentava como realidade mas em crescimento tímido, o comércio eletrônico. Foram meses de quebra-cabeça e apreensão. Como lidar com o novo? Os clientes estariam preparados para mais uma novidade?
O fato é que estavam sim. Quem não estava adquiriu um celular e passou a fazer a feira semanal sem necessitar de se deslocar ao supermercado; adquirir seus medicamentos sem ir à farmácia, realizar as transações bancárias sem sequer ter que enfrentar os caixas eletrônicos. Também aprendeu a vender, diga-se de passagem. Aqueles que demoraram a entender a nova realidade literalmente estão sendo sacrificados. A mais grave ameaça chegou sem que a maioria se apercebesse do risco: os sites de negócios liderados por grandes empresas nacionais ou estrangeiras.
Contando com custos mínimos e adotando um modelo próprio de entrega das mercadorias e exercitando preços não acessíveis ao comércio formal, foi minando gradativamente a carteira de clientes que passaram a se abastecer neste ambiente de negócio. Atualmente raras são as famílias que não usam ao menos uma vez por semana este modelo de comercialização. Enquanto isto, através do diálogo que tenho mantido com amigos comerciantes, a fuga do cliente da loja convencional é visível, facilmente mensurável e irreparável. O fato é que hoje no Brasil existem dezenas de milhares de pequenos e médios negócios em risco de extinção. Ao fazer o encontro de contas entre o que tem investido, o custo operacional, o que arrecada e os lucros auferidos chegam à conclusão que é mais fácil voltar ao rentismo, à agiotagem ou se tornar um corretor de ações e outros títulos.
Há soluções realistas para o pequeno e médio negócio?
O cenário não é dos mais favoráveis mas comparando ao que se tem visto na agricultura, ideia da qual sou um crente, sem se disponibilizar desse público de negociantes das mais modernas tecnologias da inteligência artificial e créditos facilitados e juros compatíveis com o mundo dos negócios, o que se verá é uma redução sem precedentes de lojas, boutiques, farmácias, pequenos magazines e uma corrida inglória e difícil que é o de repor as posições de emprego que foram perdidas.
Há grupo de trabalhos para dezenas de problemas que estão em busca de uma solução. Não seria a hora do Ministério de Indústria e Comércio se debruçar sobre o tema e em um período curto apresentar uma proposta à exemplo da Nova Indústria Brasil.
Faz sentido lembrar a situação de penúria e índices negativos de crescimento que apresentava o setor industrial brasileiro, mostrando sinais de recuperação mesmo tendo que ouvir alguns especialistas queixarem-se da presença do estado na economia uma vez que tudo seria resolvido pela privatização e pelo mercado.
Talvez este credo tenha funcionado em poucos países, aqui entre nós, os exemplos mais robustos de sucesso reverso é o fornecimento de energia para o estado de São Paulo que tem se demonstrado uma calamidade. Aqui não dá para se apresentar um colar de ideias que transitam do crédito à renúncia fiscal, quase sempre visando beneficiar as grandes empresas e investidores. Sendo assim, não é demérito do governo se debruçar sobre o caso e o setor parar de repetir argumentos completamente inconsistentes sobre a intromissão do estado na economia. Os mesmos especialistas que cometem este ato falho, por que razão se estuda, insistem em não reconhecer que as mudanças radicais ocorridas em países como a Coreia do Sul, Japão e China contaram com substanciais investimentos públicos em defesa de sua soberania.
Principal atividade empregadora e distribuidora de riqueza
O fato é que é o setor que mais emprega, melhor distribui a riqueza e se faz presente em todo e qualquer distrito, vila ou como se diz aqui no Nordeste, na ponta da rua.
Tratar de grandes empreendimentos com a atenção devida é fundamental. Financiar os grandes empreendimentos agrícolas, comerciais ou industriais é estratégico mas não se pode considerar que este empreendimento de menor porte que fica sufocado entre o micro e o grande necessita de um tratamento dirigido e especial. Ao que parece o mundo real em grande parte dos estabelecimentos comerciais e de serviço não reflete a propaganda um pouco exagerada de algumas instituições, agências oficiais ou até entidades representativas do setor. A pujança da economia indiana, por exemplo, está bem mais associada ao pequeno e médio empreendimento do que aos grandes conglomerados, apesar da importância desses. Neste sentido, é importante ter uma ideia clara do que representa este sinal vermelho e se procure em todos os níveis de governança uma maneira de proteger o comércio de rua antes que essas se tornem bairros inúteis com milhares de imóveis abandonados.
1Professor Titular da UFRPE-UAST