Pelo segundo ano o auditório Atikum, da UFRPE-UAST, em Serra Talhada, recebe a Orquestra IF Sertão PE, uma iniciativa do Instituto Federal do Sertão, cuja sede fica em Petrolina, mas que conta com um campus nesta cidade com cursos nas áreas técnicas e um bacharelado em engenharia civil.

A orquestra nasceu há dois anos de um projeto de extensão do IF Sertão, campus de Petrolina, coordenado pelo professor Iuri Ozires, que é seu maestro, auxiliado na direção pelo professor Adelson Scotti. Em primeiro lugar, merece uma menção especial a diretoria do instituto, que acatou a ideia e tem apoiado a iniciativa, e, a seguir, aos professores, que conseguiram juntar energia, articulação, amor pela arte e dedicação para tornarem realidade uma das iniciativas que representa aquilo que se espera de uma universidade ou, no caso de um instituto de ensino superior. Em um esforço conjunto do IF Sertão, da UFRPE-UAST e dos empresários de Serra Talhada, cinquenta e cinco componentes, entre músicos, equipe técnica, vieram de Petrolina para realizar um programa voltado ao público acadêmico e à sociedade do Sertão, tendo como foco o roqueiro Raul Seixas. Algo inimaginável se a região não contasse com esta rede de escolas de nível médio e superior formando músicos, escritores, fisioterapeutas, nutricionistas, professores, em todas as áreas do conhecimento e, em particular, alimentando a veia literária e musical do Agreste e do Sertão de Pernambuco.

A cultura e a universidade

Esta ação é a prova factual de que o ensino não pode deixar de estar diretamente associado à cultura. Um Pernambuco que conta com músicos como Luiz Gonzaga, Dominguinhos, Moacir Santos, Alceu Valença, Chico Science, Lenine, entre tantos, não pode deixar de enaltecer e deixar bem claro para os jovens que eles são fruto de um ambiente cultural de alto escol. O fato de as instituições de ensino estarem abrindo as portas para acolher a todos é uma tradução perfeita do papel dessas instituições. Elas não podem se limitar aos cursos formais, ao dia a dia da engenharia, da biologia, da computação; devem sim dialogar com o ambiente que vai além de seus muros e inserir-se na sociedade que as acolhe. Ganharam o IF Sertão, a UFRPE-UAST, os empresários de Serra Talhada que não têm faltado com o apoio às demandas da escola e, mais do que tudo, ao público que tem a oportunidade de participar de um evento de alto nível, nem sempre disponível mesmo em cidades de maior porte.

Somente o fato de a juventude estar se deparando com os instrumentos de uma orquestra, ver com cada um desses é manuseado por seus músicos, perceber a diferença de som entre um violino, um violoncelo, um trompete e uma guitarra é algo que educa, atrai e  coloca a música no papel central da formação e consolidação de uma sociedade.

Raul Seixas, sempre presente

O programa Toca Raul, da Orquestra IF Sertão, traz uma coletânea do brilhante Raul Seixas, que vivo teria 80 anos, quase a mesma idade de um outro ícone da música regional, o compositor Assisão, filho de Serra Talhada, e que se encontrava na plateia do concerto de ontem e que, coincidentemente, no próximo dia 14 de novembro de 2025, estará neste mesmo auditório sendo homenageado com o título de Doutor Honoris Causa conferido pela UFRPE como reconhecimento à sua contribuição à música brasileira.

Voltando a Raul, aquele que encantou a juventude nas décadas de 70 e 80 e continua inspirando aqueles que o acompanham desde lá e os jovens de hoje. No repertório seleto que contou com vinte músicas, de composição própria e de sua parceria com Paulo Coelho, Oscar Rasmussen, Jay Vaque, Claudio Roberto e Marcelo Mota, pode-se curtir, acompanhar e cantar juntos pérolas como Metamorfose ambulante, Al Capone, Medo da Chuva, Cowboy fora da lei, Tente outra vez e por aí afora.

O baiano Raul se foi ainda jovem, mas, além de ter participado de um dos momentos mais criativos e importantes da música brasileira, coincidentemente em uma época em que o rock, o forró e o reggae contavam com expressões como Bob Marley, Pink Floyd, The Doors, Janis Joplin, os Beatles e, no cenário nacional, as figuras de Chico Buarque, Caetano, Gil, Sérgio Sampaio, Betânia, Zé Ramalho, Alceu Valença e uma seleção extraordinária.

Concordo plenamente com o amigo Francisco Mourato quando dizia que perdeu quem não pôde se fazer presente. Ouvindo as músicas, lembrava nitidamente do ano de 1974, na praça da Prefeitura, em Arapiraca, quando, em frente à representação de seguros em que trabalhava, havia uma sorveteria de cone que insistia em tocar, sem cessar, Medo da chuva, Trem das 7, Prelúdio e o encantamento daquele álbum maravilhoso. Obrigado professor Iuri e seus jovens talentosos.

Escola x sociedade, uma relação em que todos saem ganhando

Voltando à integração entre instituições e dessas com a sociedade sertaneja, o exemplo da Orquestra deve servir de base para iniciativas nas áreas da saúde, educação, letras, engenharias, direito, tecnologia da informação. O sertão merece saber o que tem ao dispor, fazer uso das dezenas de cursos que estão sendo ofertados, incentivar o ingresso dos jovens nas escolas públicas e privadas e aproveitar um patrimônio incomparável. Recentemente estive fazendo um levantamento sobre as engenharias no interior. Somente nas instituições públicas UFRPE, UFPE, UPE, UNIVASF, IF PE, IF Sertão são oferecidos 32 cursos nos campi do interior de Pernambuco.

Alguém imagina quão difícil era para um jovem de Ouricuri ou Santa Filomena estudar engenharia ou agronomia há vinte anos? O cenário é outro, mas sobre ele restam alguns desafios. As instituições necessitam de se fazerem vivas e contar com a presença massiva dos jovens em suas salas, corredores, pátios e laboratórios. Que façamos de nossas escolas o dínamo da nossa cultura e economia. Parabéns IF Sertão, UFRPE-UAST, sociedade serratalhadense e, de modo especial e carinhoso, à Orquestra IF Sertão e seus componentes.

1Professor titular da UFRPE-UAST, em Serra Talhada, PE