O Simpósio Água Innovation é um evento anual que ocorre em Fortaleza, Ceará, organizado pela iniciativa privada contando com a participação de empresas, órgãos de representações de produtores, formuladores de política, instituições de fomento e entidades governamentais. O nome explica o propósito. O mentor da iniciativa, o empresário e ex-secretário de Agricultura Irrigada do estado do Ceará, Carlos Matos, teve como objetivo principal focar em um tema considerado prioritário para a agropecuária nordestina, em particular do semiárido, a água.

Água no sentido múltiplo, visando  a construção de uma política de recursos hídricos voltada para as atividades agrícolas e agroindustriais em uma dimensão de futuro, que o uso eficiente, a otimização da captação e do armazenamento, a relação entre as microbacias, as bacias hidrográficas e em especial o valor deste insumo pudesse ser estudado de modo diferente do que normalmente tem sido o estilo que prioriza os investimentos públicos em obras, em gestão de situações emergenciais como é a distribuição de carros pipas, o uso do Proagro, a protelação ou perdão de empréstimos e a sensação de que a única solução para o semiárido são as políticas públicas compensatórias.

De antemão ficou claro que esta visão de desenvolvimento dependente não levará a um bom termo muito embora haja por bem se reconhecer os esforços e as conquistas em termos de acesso a água devido às obras físicas empreendidas em toda a região nos últimos vinte anos em termos de perfuração de poços, construção de açudes, barragens superficiais ou subterrâneas, adutoras e canais, tendo como principal destaque a rede distribuição implementada a partir do conjunto de obras mais conhecido como Transposição do São Francisco.

A iniciativa privada toma as rédeas

Reconhecendo-se que apesar de alguns exemplos positivos de desenvolvimento regional em alguns estados destacando-se Pernambuco e Bahia, com os perímetros irrigados no submédio São Francisco e a irrigação via pivô central no oeste da Bahia; o estado do Ceará com os esforços empreendidos pelo DNOCS e pelo governo do estado em regiões como a Serra da Ibiapaba, Tabuleiros de Russas e Baixo Acaraú, os resultados são pouco expressivos, a exemplo do que pode ser observado no Baixo São Francisco ou na bacia do Rio Parnaíba. Esta leitura, a partir dessas discussões despertaram no ambiente privado a vontade de participar de forma determinante no processo de concepção e decisões, mudando um pouco a lógica do processo. Ao invés de esperar pela iniciativa governamental em apresentar planos e programas, que partisse do mundo empresarial este esforço de apresentar ao governo as demandas mas também indicativos e projetos considerados prioritários.

Nas diversas versões do fórum foram dezenas de empresários, técnicos, especialistas do Brasil e do exterior que aportaram conhecimento, experiência e visão de futuro à política de aproveitamento eficiente das águas, sejam de qualquer origem: pluviais, poços rasos, poços profundos barragens, córregos rios, barreiros, sistemas complexos ou simplificados de irrigação. O trabalho de Sísifo que redundou  no voltar  derrotado vendo a rocha rolar morro abaixo, passou a ser um dos feitos de Ulisses que em seu retorno à Ítaca encarou, um a um, desafios quase intransponíveis até a volta ao lar, à sua  Penélope e ao seu cão, Argos.

É esta a beleza deste esforço coletivo liderado por alguém que a cada ano demonstra mais gana, crença no sucesso e o espírito inquieto característico de vencedores. Parabéns, Carlos Matos e todos aqueles que estão com você neste empreendimento

Agendas prioritárias

Nos últimos dias, como exercício para o ano de 2025 foram estabelecidos alguns eixos estratégicos: pecuária de leite intensiva, produção de hortaliças de alto valor agregado, capacitação de gestores.

Havendo sido o estado em que o ciclo de seca de 2012 a 2018 não afetou diretamente a produção e se tornando um dos principais estados produtores de leite do Brasil, aqueles que fazem a pecuária cearense não se sentem confortáveis com a produtividade de suas vacas e pretende colocar em movimento um programa de Pecuária Intensiva que tenha como meta produtividade diária por faca entre 30 e 35 litros. Avançou-se na discussão como em nenhuma outra unidade da federação sobre o conforto animal e a produção de alimentos. Começa a ser discutido como lugar comum termos como ´compost barn´, ´free stall´, algo considerado herético há alguns anos e que se traduz como o que mais moderno de tecnologia existe aplicado à produção de leite e carne no Nordeste.

Quanto às hortaliças, há algo interessante. Quando do primeiro governo do ex-governador Tasso Jereissati, em 1987, as principais culturas agrícolas no estado do Ceará eram milho, feijão e mandioca. Hoje, em valor agregado estão o tomate de mesa, a banana e o melão. O Porto de Pecém é o que movimenta a maior quantidade de cargas em exportações de frutas da região Nordeste e o empreendedorismo e a busca por novas opções de negócios é que se ouve nos meios empresariais.

A última escolha foi um investimento diferenciado em gestão técnica e empresarial de novos profissionais visando a demanda do mercado. Um ambiente que se tornou ávido por conhecimento, domínio das tecnologias agrícolas e digitais mais avançadas, conhecimento das cadeias produtivas no nível nacional e internacional e fluência em línguas estrangeiras. Hoje o inglês e espanhol, amanhã o mandarim, o hindi e o russo. Sobre este tema, o seminário apresentou aos presentes uma fala do empresário Fábio Regis, CEO do Sítio Barreiras, em que trouxe um caso absolutamente atípico de cultivo e gestão de inteligência e conhecimento. Um verdadeiro manual de gestão estratégia de pessoas.

São programas, projetos que serão construídos, implementados, avaliados e tornados empreendimentos de maior ou menor porte.

O Nordeste deve se fazer presente como um todo

E aí, no dia de ontem, 13 de novembro de 2024, foi oficialmente lançada a plataforma Coalizão Agro Nordeste, instrumento que hospedará e cuidará desses empreendimentos e dos outros tantos que surgirão a partir deste movimento.

Estavam presentes lideranças dos setores privado e público dos estados do Ceará, Rio Grande do Norte, São Paulo, Distrito Federal e Pernambuco. Orgulhosamente subscrevi a adesão ao movimento e a crença de que apenas com iniciativas disruptivas se conseguirá mudar de forma definitiva a face do Nordeste Rural. Esta coalizão encontra-se aberta a todos os estados da região que devem participar não apenas porque é algo interessante, mas por tratar-se de uma iniciativa que dialoga com o futuro e não há como se pensar um estado isolado sem pensar nos benefícios de uma ação coletiva. Não vejo impedimento algum em ter o Ceará liderando este empreendimento que à exemplo do agronegócio familiar ou empresarial, deve servir de modelo para outros segmentos como a política industrial, a infraestrutura logística e de transportes e a atração de investimentos.

1Professor Titular da UFRPE-UAST