Uma viagem que não estava em nossos planos mas que atendendo a uma sugestão do amigo João Daniel foi planejada, realizando-se esta semana. Rever a Princesa das Américas, uma encantadora cidade farta de beleza arquitetônica, parrillas, doce de leite, alfajor, futebol e música  não podem se desperdiçar, e assim fomos nós à Mi Buenos Aires querida, um dos mais destacados tangos de Gardel, gênio ao qual faremos referência a seguir.

O roteiro, construído por Sônia, Suzana e Eliete foi um total acerto. Ver o Teatro Colón, um dos mais imponentes teatros do mundo,  logo à frente contemplar o Obelisco, vagar pela Av. 9 de Julho, ir ao mercado de San Telmo, embromar algum tempo na  belíssima livraria El Ateneo e ainda ter a chance de atravessar o Paraná, o Rio de la Plata e conhecer uma pequena comunidade uruguaia, Colônia de Sacramento com sua história belíssima e os resquícios da colonização portuguesa, nos fazendo lembrar as casas com telhados em duas águas tão bem expresso quanto ao ver a Rua dos Suspiros, em direção ao rio, com este nome tão sugestivo. Dias bonitos, alegres e com aquele frio gostoso que somente sentimos nas madrugadas sertanejas de julho a agosto.

 A paixão argentina, o futebol

Desde algum tempo não se ouve mais uma frase que era repetida com frequência durante minha infância, o Brasil é o país do futebol. Não sei se desistimos dela, se nossa admiração diminuiu ou se passamos a admirar outras modalidades, o fato é que em termos de torcida nada se compara à relação entre os Porteños, habitantes de Buenos Aires e a bola como nenhum outro povo. No último domingo, João e Eudes, nossos companheiros de viagem resolveram assistir ao jogo do River Plate contra o  Newell´s Old Boys. Um time com uma das maiores torcidas contra um que se encontra próximo à zona de rebaixamento do campeonato argentino. Ficaram admirados ao verem oitenta mil torcedores no estádio Monumental de Nuñez, cantando os hinos do River durante toda a partida, mesmo o placar não ter saído de um zero a zero.

Mas o mais belo é presenciar a reverência do povo argentino ao seu ídolo máximo, Diego Maradona, são centenas de murais espalhados pela cidade dando conta de quão importante foi este jogador excepcional para a história recente do povo Argentino. Diego é um dos jogadores que pode ter em seu currículo um atestado de que ganhou uma copa do mundo, a exemplo de Garrincha, Beckenbauer, Paulo Rossi e, há alguns meses, Messi. Este não é apenas o caso. Maradona é um filho do povo, de família humilde, de Lanús, que em 1986, resgatou o orgulho de uma nação humilhada e despedaçada pela Guerra das Malvinas, uma atitude insana de um governo militar que apodrecia, dando no que deu. Uma derrota para os ingleses que contaram com o apoio direto dos Estados Unidos para reter os domínios das ilhas que ficam a milhares de milhas e tão próximas do território argentino, lamentavelmente.

Maradona em uma partida que se tornou lendária, em 22 de junho de 1986, no Estádio Azteca, na cidade do México, marcou os dois gols da vitória, um em que driblou quase todo o time adversário, sendo considerado o mais belo gol em todas as copas, o outro, demonstrando a picardia e a esperteza de alguém que literalmente roubou, com a mão de Deus, aquilo que havia sido subtraído ao seu povo, a alegria e a paixão. Um feito tão importante como  a copa em si, que o colocou no panteão dos heróis nacionais junto com José de San Martin, Evita Perón e Carlos Gardel.

Gardel e Luiz Gonzaga, dois gigantes

E aí, o que tem a ver Buenos Aires com o Sertão de Pernambuco, a música. Dois artistas que viveram no século passado marcam a vida de seus povos. Gardel, um jovem de origem desconhecida, conta a lenda que nasceu na França, retirou o tango dos bares e dos cabarés para o reconhecimento universal. Fazendo com que entre as casas de tango e os casais de passistas ambulantes, sejam tanto ou mais que os murais em homenagem ao Pibe de Oro. Gardel conquistou as Américas, inclusive o Brasil, onde esteve várias vezes durante sua curta passagem, afinal se despediu aos quarenta e cinco anos, e na Europa, o que trouxe o charme o respeito para uma sociedade que sempre se considerou como uma extensão europeia nas Américas. Não há dúvida de que o jovem argentino conhece tão bem o hino nacional quanto Mi Buenos Aires Querido ou Volver.

Em um Sertão seco, distante, em que um jovem sanfoneiro teve que fugir para não ser pego pelo pai da namorada, depois de ter mexido com a moça, surge um outro fenômeno que transforma o baião em uma paixão nacional. Renomeado como Forró mas com a certeza de que Gonzagão onde descanse saiba que Asa Branca, Petrolina-Juazeiro e Xote das meninas têm o mesmo efeito rejuvenescedor para a alma nordestina quanto aos tangos de Gardel aos irmãos argentinos.

Voltaria à Argentina

Ao retornar fui dar uma olhada em vídeos no YouTube sobre a Argentina. Parando em Paraná, a cidade capital da Província de Entre Rios com seus ipês floridos, ruas tranquilas e limpas e sua relação com o rio que lhe dá o nome e Mendoza, capital da província de Mendoza, conhecida por seus vinhedos, vinícolas tão conhecidas e a deslumbrante vista dos Andes. Por falar em Mendoza deixa-me fazer o registro de uma outra conexão com a nossa região. A Hortivale, empresa produtora e comercializadora de sementes de hortaliças, sobre a qual já comentamos aqui, por um bom tempo chegou a produzir sementes de cebola, das variedades IPA naquela região. Clima fresco e frio o que permite a indução floral dos bulbos sem a necessidade de câmaras frigoríficas. A verdade é que o mundo é, de fato, pequeno.

Sônia me pediu para não esquecer de dizer ao João, Suzane, Eudes e Eliete que  foram excelentes companheiros e ótimo estar com vocês nas boas andadas à Calle Florida, Caminito, Lavalle e tantas ruas e restaurantes portenhos.

Serra Talhada, 31de agosto de 2024.